sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Quietude

Um dos melhores feriados de carnaval que passei foi no ano de 1982. Um grupo de amigos alugou uma casa em Muriqui, e de lá partimos para vários passeios pela região praiana do sul do Rio de Janeiro. A casa era confortável, bastante arborizada e o riacho que corria no pequeno leito, cujas águas cantavam no tilintar entre as pedras ao fundo quintal, completava o adorno natural daquele lugar. À noite, depois que todos iam dormir, eu ficava na varanda ouvindo o som da água correndo livre e lenta. Um momento ímpar de reflexão. Olhos fechados, buscando o silêncio da alma na ânsia de encontrar comigo mesmo, divagando em pensamentos mil. Eu era tão jovem, cheia de expectativas, começando a vida de casada, grávida da primeira filha e num momento muito feliz da vida.

Normalmente na juventude não damos muita importância aos momentos de reflexão e serenidade. O que passa pela mente são apenas pensamentos que vem e se desfazem como num sopro. A quietude da alma para escutar a si mesmo é pouco ou nada entendida. Só há preocupação em absorver superficialmente o que é externo e nunca a busca reflexiva do que há dentro. Os orientais desde cedo são ensinados que através do silencio é que a introspectiva acontece abrindo caminho pra que a pessoa esteja em harmonia consigo mesma, para depois se harmonizar com o mundo exterior.

Diferente do que aprendemos no ocidente de um modo geral, pois, vivemos o burburinho da alma, numa vida a mil por hora, onde a agitação não é apenas da cidade apinhada de gente falando, e carros buzinando, máquinas quebrando asfalto, ambulantes vendendo seus produtos. Ela começa no interior do ser humano num som incontrolável que ultrapassa o limite cabível de decibéis. E quando menos se espera a válvula de escape se rompe em forma de doença, que pode ser de ordem física ou psíquica.

Não conhecemos a nós mesmos e muito menos o que se passa no interior, na imensidão da mente, o pequeno vasto mundo impenetrável. Uma gama de sentimentos com sensações próprias habitam o ser e estes vez por outra saem do equilíbrio, então é necessário coloca-los de volta em ordem, em grau de importância, para que se mantenha apto dentro de uma normalidade comum.

O fato de não pararmos para saber o que está acontecendo dentro de nós causa muito transtorno. As situações não entendidas, portanto mau resolvidas, atropelam o fluxo da vida que deveria fluir livremente. O burburinho das vozes que ecoam dentro de nós quando estamos sendo confrontados pela vida e com muita raiva dela, nos atormenta. E quando isto acontece, é estritamente necessário “parar” a fim de rever situações, sentimentos e conceitos. Coisa que só se encontra em momento de quietude reflexiva, pois, “o silencio é a primeira higiene da consciência”.

Minha amiga Cátia Gabriel vive no Japão e após o momento da grande calamidade neste último terremoto e tsunami, testemunhou sobre a serenidade e educação do povo. Isto já é cultural. Um povo sereno, tranquilo e educado. Povo que já traz em seu bojo o compromisso que cada um deve ter com o bem estar do outro. Ora, se eu não estou bem comigo mesma não posso estar bem com meu semelhante. Isto é fato real, porém, o que se vê nítido e claro em nossa sociedade é gente perdendo-se de si mesma cercada de uma multidão.

Quando o apóstolo Paulo em I Coríntios 11, 28 diz: “Examine-se cada um a si mesmo e então coma do pão e beba do cálice”, tomamos apenas para o que cometemos na área de pecado ou qualquer tipo de transgressão, mas, na pouca sabedoria de tenho suponho que este versículo pode ser interpretado de forma mais abrangente. Examinar é averiguar os caminhos pelos quais o coração quer nos levar. É examinar a si mesmo na ânsia de descobrir onde se faz necessário melhorar, onde o caráter precisa ser lapidado, onde o coração precisa ser moldado pelo fato de ser enganoso a ponto de chegar a vender-se por tão pouco. “Enganoso é o coração do homem, mais do que todas as coisas e perverso, quem o conhecerá?” Jeremias 17:9. E isto deve acontecer antes que sejamos enredados em alguma falta. A sublimidade em participar de elementos que simbolizam corpo e sangue de Jesus deveria ser entendida e absorvida com maior sabedoria para pudéssemos extrair toda riqueza deste simbolismo, e assim trazer vida e saúde plenas para a alma.

A facilidade que temos em examinar a vida do outro, em cuidar da lavoura do vizinho enquanto, não enxergamos a sequidão do próprio terreno, é absurda. Por isso os momentos de reflexão tanto a sós bem como aqueles especiais com Deus, são preciosíssimos. Eles nos ajudam a olhar para dentro num giro interior e enxergar aquilo que outros enxergam e nós não enxergamos por conta do tamanho exacerbado do nosso eu cego.

Por isso, este exame é fundamental, para encontrarmos dento de nós a pessoa brilhante que Deus criou a partir dele mesmo. Só assim acreditaremos na capacidade que Ele já nos deu, aliado aos talentos naturais que vem junto no pacote. Sendo libertos das coisas pequenas que nos prendem e, são de grande impedimento para o sucesso.

Deus abençoe a todos.

Denise Figueiredo Passos